A obra de Victor Meirelles pertence à tradição acadêmica brasileira, formada por uma mistura de referências neoclássicas, românticas e realistas, mas o pintor absorveu também influências barrocas e de outros grupos.
Depois de um período de relativa obscuridade, a crítica recente o reinstalou como um dos precursores da pintura moderna brasileira e um dos principais pintores do século XIX, para muitos o maior de todos, sendo autor de algumas das mais célebres recriações visuais da história brasileira, que permanecem vivas na cultura nacional e são incessantemente reproduzidas em livros escolares e uma variedade de outros meios.
A tela Moema inspira-se no canto VI do poema épico Caramuru (1781), de frei José de Santa Rita Durão (1722 – 1784), que, como outros textos literários do período, trata do tema indianista ligado ao imaginário nacional.
O poema narra a desventura da índia que, abandonada pelo português Caramuru, se atira ao mar e segue o navio no qual ele está partindo.
Caramuru levava em sua companhia apenas a índia Paraguaçu.
Na estrofe XXXVII do poema, o autor narra a situação de Moema:
“Copiosa multidão da nau Francesa
Corre a ver o espetáculo assombrada;
E ignorando a ocasião da estranha empresa,
Pasma da turba feminil, que nada:
Uma, que às mais precede em gentileza,
Não vinha menos bela, do que irada:
Era Moema, que de inveja geme,
E já vizinha à nau se apega ao leme.”
Moema morre de exaustão e seu corpo é levado até à praia pela maré, onde é encontrado.
No quadro, o corpo nu, banhado pelas ondas na praia, é exposto em primeiro plano, o rosto revela uma beleza exótica.
O pintor cria uma imagem sensual e que, ao mesmo tempo, causa estranheza.
Revela um sentimento poético na representação da paisagem.
A cena representada por Victor Meirelles não consta no poema original de Santa Rita Durão.
O artista optou por um momento posterior à narrativa do poema, criado por ele mesmo.
E foi além, criando ele próprio também uma nova narrativa, com a presença dos índios que estão prestes a resgatar o corpo de Moema, fazendo assim um novo fecho para o drama da heroína trágica.
Em vez de sepultá-la no mar, como faz Santa Rita Durão, Meirelles trouxe-a de volta para sua terra, e indicou que seu corpo seria resgatado, o que remete a se imaginar que seriam dados a ela os rituais fúnebres próprios de sua cultura.
O que se pode considerar inicialmente a respeito deste tratamento mais piedoso que o pintor dá à personagem, é que ele pode estar relacionado ao contexto social abordado anteriormente, o qual transformou Moema em uma personagem de relevo, valorizando-a e dando-lhe maior importância do que no poema.
Na pintura, o corpo nu de Moema, em primeiro plano, encontra-se numa praia desértica, em meio a pedras, areia e conchas.
Tudo em derredor parece silencioso e calmo.
Até o mar mostra-se quieto.
O dia parece estar amanhecendo.
Os cabelos negros e revoltos da índia estão espalhados sobre a areia, como se servissem de travesseiro para seu rosto pálido, voltado para o céu.
Ela ainda traz no corpo parte da tanga de penas coloridas, que lhe cobre a púbis, arranjo esse que tira a naturalidade da pose.
Na época em que foi feita, a pintura teve pouca repercussão, contudo, atualmente é vista com outros olhos.
Críticos e historiadores de arte têm-na como um importante marco na carreira de Victor Meirelles, sendo um dos mais notáveis exemplos do indianismo romântico na artes visuais brasileira, transformando-se num ícone nacional, inclusive recebendo várias releituras e sendo objeto de estudo nas escolas.
Ficha técnica
Título: Moema
Ano: 1866
Técnica: óleo sobre tela
Dimensões: 129 x 190
Acervo: Museu de Arte de São Paulo (MASP), Brasil
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Respostas de 2
Excelente informação. Obrigado!
Olá, Joaquim, agradecemos seu comentário. Continue visitando nosso site. Abraço